Caixa de Pandora
A humanidade caminha a passos largos no que diz respeito à evolução tecnológica, gabando-se de seus feitos extraordinários e dos rumos que seguem, impulsionados por sobressaltos cada vez mais altos e velozes nesse sentido.
A Internet das Coisas, como nomeiam, alimenta o apetite insaciável do ser humano que a tudo devora, deixando com um narcisismo potencialmente perigoso, deixando de lado premissas fundamentais de tudo mais que faz de nós aquilo que somos: orgânicos, tridimensionais, sociais e sensoriais.
Engana-se quem crê
que esse universo virtual aproxima pessoas, que proporciona felicidade e que
desenvolve mentes das novas gerações. Como tudo nesse mundo de faz de
conta, a ilusão é a única coisa concreta que se tem certeza.
Os excessos que desfrutamos sem limite dessa "realidade" têm despertado o melhor e o pior que há em nós.
Infelizmente não possuímos maturidade psíquica para lidar com os desdobramentos que essa internet de todas as coisas nos dá, e não creio que teremos um dia.
Deixamo-nos absorver por esse ser disforme e sem vida, que não sente empatia, cujo objetivo é retirar a identidade que possuímos e que nos faz indivíduos, únicos, tomando, ainda, em troca para si, aquilo que mais prezamos, que é nossa individualidade, transformando-nos naquilo que lhe constitui: uma coisa.
Hoje é comum olhar para a mesa ao lado num restaurante, e assistir a adultos desfrutando um belo jantar, na companhia de outros, porém, mergulhados em seus smartphones, balbuciando uma palavra aqui e outra ali, vez ou outra, ou assistir a pais mudos, focados em seus pratos cheios e em seus corações vazios, deixando seus filhos imersos e distraídos nos desenhos infantis que os aparelhos reproduzem sem parar.
Depois de aberta a Caixa de Pandora, nada mais é o mesmo, e aquilo que foi liberto de lá, não volta.
O que nos resta?
Resta-nos a esperança de colocar a mão em nossas consciências e rever essas "todas as coisas" que se abriram diante de nós, para entender que o mundo real está aqui, agora, em mim, em você e no outro, nas relações concretas e nos sentimentos verdadeiros expressos no olhar, no toque, no beijo, no carinho, na palavra, no amor que só um ser humano é capaz de dar ao outro, porém, de verdade.
Que essas tecnologias ocupem em nossas vidas sim somente a posição de ferramentas, de coisas como propõe, e nada mais.
Pandora - John William Waterhouse - 1896